Iemanjá: senhora e rainha do mar.

Na tradição do candomblé, Iemanjá é a mãe suprema, pois de seu ventre nasceram todos os orixás. De acordo com Pierre Verger (Orixás. São Paulo: Corrupio, 1981), “Iemanjá, é o orixá dos Egbá, uma nação iorubá estabelecida outrora na região entre Ifé e Ibadan, onde existe ainda o rio Yemanjá. As guerras entre nações iorubás levaram os Egbá a emigrar na direção oeste, para Abeokuta, no início do século XIX. Não lhes foi possível levar o rio, mas, transportaram consigo os objetos sagrados, suportes do axé da divindade, e o rio Ogun, que atravessa a região, tornou-se, a partir de então, a nova morada de Iemanjá. Este rio Ogun não deve, entretanto, ser confundido com Ogun, o orixá do ferro e dos ferreiros”. No Brasil, o culto a Iemanjá voltou-se para as águas salgadas. Aqui, seus fiéis voltam-se, preferencialmente, para os mares quando desejam dirigir pedidos à grande mãe. E Iemanjá jamais nega um pedido de quem o faz com o coração limpo, como já demonstrou o Dorival Caymmi quando escreveu: “Eu mandei um bilhete pra ela pedindo para ela me ajudar. Ela, então, me respondeu que eu tivesse paciência de esperar. O presente que eu mandei pra ela de cravos e rosas vingou”. Como se pode perceber o segredo é ter paciência de esperar para que o presente vingue. E ele sempre vinga.

A Festa para Iemanjá no Rio Vermelhor-Salvador-Bahia
Excepcionalmente, o Poema Falado de fevereiro está a ser publicado não no primeiro domingo do mês, mas, sim, na primeira segunda-feira, pois amanhã será o grande dia, o dia de Iemanjá. Para homenageá-la, o poema “Canto de Iemanjá”, do Vinícius de Moraes: “Iemanjá, lemanjá. lemanjá é dona Janaína que vem. Iemanjá, Iemanjá. lemanjá é muita tristeza que vem. Vem do luar no céu. Vem do luar no mar coberto de flor, meu bem, de Iemanjá. De lemanjá a cantar o amor e a se mirar na lua triste no céu, meu bem, triste no mar. Se você quiser amar, se você quiser amor, vem comigo a Salvador para ouvir lemanjá, a cantar, na maré que vai e na maré que vem. Do fim, mais do fim, do mar. Bem mais além. Bem mais além do que o fim do mar. Bem mais além”. Vale a pena conferir o vídeo abaixo, nosso presente para Iemanjá, senhora e rainha do mar. Louvemos, então, Iemanjá! Odóiyá! (por Sílvio Benevides, Coccinelle e Papillon).


Verão em Salvador é tempo de muito calor, água de coco, festa e praia. Também é tempo de exibir e apreciar o corpo. Os antigos gregos definiam o corpo como instrumento da alma. Essa definição possibilitou duas visões bem distintas em relação ao corpo: em alguns momentos ele é visto com apreço pela função que exerce, sendo elogiado ou exaltado; ora é criticado por não corresponder a seu objetivo ou por implicar limites ao crescimento da alma devido a seus instintos, desejos e pulsões. Nesse sentido, o corpo é condenado, oprimido e execrado como túmulo ou prisão da alma, sempre nobre e sublime. Apesar dessa visão, durante séculos corpo e alma foram concebidos como duas substâncias indissociáveis. A partir do dualismo cartesiano, entretanto, aparecem como substâncias distintas uma da outra. Para Descartes, ao corpo pertence todo calor e todos os movimentos existentes em nós, não dependendo, em absoluto, do pensamento. O corpo é, portanto, visto como uma máquina que se move por si, não estando relacionado a qualquer força externa ou de natureza distinta da sua, pois traz consigo “o princípio corpóreo dos movimentos para os quais foi projetado, juntamente com todos os requisitos para agir”. Tal perspectiva abriu espaço para que o corpo pudesse, enfim, ser visto não com desprezo, como o foi por muito tempo, especialmente ao longo da Idade Média, mas, sim, com admiração, pois corpo é também beleza, desejo e paixão, como demonstraram os gênios do Renascimento. 